domingo, 2 de dezembro de 2012

A Esperança do Universo


Toda a criação está gemendo por algo que desconhece, mas lhe é essencial. Está gemendo com a necessidade de ser libertada de um estado que é apenas uma transição e não uma realidade, de ultrapassar uma condição que não corresponde de modo algum à intenção que deu origem à existência. Em todas as partes da criação, este gemido de uma ideia acorrentada em busca de uma vida mais livre parece ser a primeira exigência cumprida de um mandato sagrado, o primeiro movimento realizado por um ser agrilhoado em direção à liberdade em um novo nascimento.
Há muitos, eu suspeito, que do oitavo capítulo da epístola de São Paulo aos Romanos extraem isto e nada mais: que os animais inferiores que estejam vivos no retorno do Senhor, quando quer que isto ocorra, e os que desde então possam vir a existir, levarão uma vida feliz pelo tempo que lhes caiba! Grandes paladinos de Deus, esses sagazes fiéis! Que amantes da vida, que discípulos de São Paulo, ou melhor, que discípulos de Jesus, esses que consideram que uma tal saída é consolo para os gemidos do universo!
Se a vida eterna é uma ideia de algum modo preciosa para você, é essencial para que desfrute dela que ninguém abaixo de você participe da sua realização? Você é o tipo mais baixo de criatura que poderia ser autorizado a viver? Se Deus tivesse um coração como o seu, Ele teria dado a vida e a imortalidade para criaturas tão inferiores como nós?
Aqueles que esperam pouco não podem crescer muito. Para eles, a própria glória de Deus deve ser uma coisa pequena, pois a sua esperança é tão pequena que não justifica regozijo. Que Ele é um criador fiel não significa nada para eles, dada a maneira como veem a parte amplamente majoritária das criaturas que Ele fez! De fato, a sua noção de fidelidade é tão pobre que não pode ser forte a sua fé!
As coisas criadas, olhando, na ponta dos pés, esperam a revelação dos filhos de Deus. Por quê? Porque Deus sujeitou a criação à vaidade na esperança de que a própria criação seja redimida da prisão da corrupção para a gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Por esta dupla libertação - da corrupção e da consequente sujeição à vaidade, a criação está aguardando ansiosa.
Deus enfrenta e reage às cadeias da corrupção com a submissão à vaidade. A corrupção é o rompimento da ideia essencial, é a queda para fora do ninho, para fora do pensamento causador da vida. Enfrenta o sofrimento que ela mesma causa. Este sofrimento é para redenção, para libertação. É viver naquilo que se corrompe que torna possível o sofrimento. É a parte viva, não a parte corrompida, que sofre. É o que é resgatável​​, não o que está condenado, que está sujeito à vaidade. A espécie humana em que o mal, isto é, a corrupção, está agindo, necessita, como único caminho para o seu resgate, a sujeição à vaidade. É a única esperança contra a supremacia da corrupção. E toda a criação, que cerca, abriga e ajuda a humanidade, para o bem desta, sua cabeça, e para o bem dela própria também, participa desta sujeição à vaidade com sua esperança de libertação.
Quanto mais coisas os homens possuem, tanto mais eles imaginam que precisam, tanto mais eles estão sujeitos à vaidade, todas as formas da qual podem ser resumidas na palavra decepção. Aquele que não aceita o desapontamento, é obrigado a procurar o incorruptível, o verdadeiro. É obrigado a quebrar as cadeias de posses, exibições, rumores, elogios, fingimentos e prazeres egoístas. É obrigado a sair do falso para o real, sair da escuridão para a luz, sair da escravidão da corrupção para a gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Para levar os homens a romper com a corrupção, põe-se diante deles o abismo dos bocejos ocos. Com a alma horrorizada, clamam: "Vaidade das vaidades! tudo é vaidade!" e para além do abismo começam a descobrir o mundo eterno da verdade.
Tanto quanto a criação geme em trabalhos de parto nós mesmos, que temos as primícias do Espírito, também gememos em nós mesmos aguardando .... a redenção do nosso corpo. Nós não somos livres, isto implica, até que nosso corpo seja remido. Então toda a criação será livre conosco. Assim, Paulo considera a criação como parte da nossa encarnação. Toda a criação está aguardando a manifestação dos filhos de Deus, isto é, a redenção do seu corpo, cuja noção se estende a toda sua envoltória material, com toda a vida que lhe pertence. Para esta como para eles, as cadeias da corrupção devem cair. Ela deve entrar na mesma liberdade com eles, e tornar-se aquilo para que foi criada - um templo vivo, aperfeiçoado pela habitação ininterrupta do seu deus.
Quando os filhos estejam livres, quando seus corpos estejam resgatados, eles vão erguer com eles a criação inferior para a sua liberdade. A perfeição dos filhos aguarda também os habitantes mais humildes do nosso mundo, a chegada destes seguindo imediatamente a manifestação dos filhos de Deus. Para o nosso bem e deles mesmos foram submetidos à vaidade. Para o nosso bem e deles mesmos, serão restaurados e glorificados, isto é, elevados conosco. (Resumo de The Hope of the Universe, de George MacDonald)

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