O homem
no mundo, desde pequenino, enfrenta carências sucessivas: de segurança, carinho,
auto-estima. Primeiro, sente medo. Depois, não recebe o consolo que esperava
dos outros. Diante disto, tenta lutar sozinho e percebe que não é capaz. Mas,
quando diz a si mesmo: “Não sou digno”, como o filho pródigo que lembra da
terra do Pai, pode começar a explorar a possibilidade da transcendência. Esta
lembrança abre um caminho. Humildade e esperança, ao alcance de qualquer um,
pavimentam esse caminho. Receber a boa-nova de que há um Deus bom é, nesse
caminho, um primeiro passo.
Parêntesis:
a fé que conta não é no Deus da Filosofia, bom porque é único, absoluto. Se Deus
deu corda no mundo e saiu da História, não há como ultrapassar a experiência de
insegurança. Nesse caso, no mundo continua a prevalecer o Mal. O Evangelho de
Cristo não se ocupa com o Deus Criador fora do Mundo, diz que Deus se faz
presente neste mundo. E se faz presente como Amor. É o encontro dessa boa nova
que é a graça da fé.
Ao homem
ferido e agredido, que percebe que não é capaz de lutar sozinho, a revelação da
presença de Deus neste mundo como amor capacita a não depender só de si mesmo. Recebendo
o Evangelho, aprende que pode contar com ajuda maior. Mas, se esse aprendizado
ficar limitado ao âmbito do conhecimento, sua realidade ainda é dominada pela
insegurança. Saber que não estou abandonado não basta para que deixe de me
sentir abandonado.
Depois da
revelação da verdade do amor do Pai, vem sua constatação no sacrifício do Filho.
O conhecimento que se pode extrair de Jesus que ensina ao pé do monte ganha
vida quando se contempla Jesus que se entrega no Calvário. Ao acompanhá-lo no
Getsêmani, na Via Sacra e na Cruz, amando-nos mesmo quando o crucificamos,
experimentamos a sensação de ser amado. O Deus de Amor não está na distante
criação do mundo, mas, está vivo neste homem que morre na cruz.
Só que Jesus
crucificado é uma semente lançada, que pode cair na beira do caminho, sobre a
pedra, entre os espinhos... É outra vez a graça de Deus que a faz encontrar no
humilde a boa terra, em que virá a vencer as atrações, as objeções e as
distrações que o cercam e produzir mais amor, a cem por um. Recebendo o amor do
Filho, vivo o amor ao Pai e mais, o Amor do Pai a toda criatura vem viver em
mim.
A mudança
se completa quando o exemplo de Jesus me atrai a viver como Filho de Deus, a
realizar a obra do Amor. Nesse terceiro estágio, como Paulo, já não sou eu que
vivo, mas é Cristo que vive em mim. Amar ao Pai é amar ao próximo como o
samaritano, não basta voltar-se para o Deus distante como os religiosos que
passam pelo ferido indiferentemente.
A história não termina aí porque a
transformação que se realiza nos escolhidos não é suficiente para extinguir o
Mal que a presença do amor só vence dentro de nós. Não há maior vitória que exercer
a liberdade de realizar a vontade do Pai de fazer o bem a toda criatura, mas, a
presença do Amor neste mundo não se destina a extinguir as carências das suas
pequenas criaturas. Como Jesus seus seguidores não são poupados de dificuldades
nem de perseguições. Mas, para quem está a serviço da vontade do Criador, as
derrotas no mundo não contam.
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